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Informação profissional do setor das instalações em Portugal

Mobilidade elétrica – Enquadramento internacional e boas práticas

Andreia Carreiro (1), Inês Gaspar (2)28/12/2023
Os Veículos Elétricos não representam apenas uma escolha com benefícios económicos e mais ecológica, mas também têm o potencial de ser um ativo estratégico na transição energética.
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A descarbonização é uma prioridade a nível europeu e nacional, reforçada pelo ambicioso pacote de transição energética - o ‘Fit for 55′, com o objetivo de reduzir as emissões de CO2 em cerca de 55% até 2030 para atingir a neutralidade carbónica até 2050. É, assim, uma necessidade premente que exige ações imediatas e efetivas, para as quais todos os cidadãos são chamados a intervir e contribuir, a par dos Governos, das empresas e dos demais agentes públicos e privados.
O setor dos transportes apresenta uma elevada pegada ecológica, tendo um peso significativo no contributo para as emissões de CO2, cerca de 25% a nível europeu, sendo, portanto, um dos principais setores a necessitar de ser eletrificado para a sua descarbonização. Assim, surge a mobilidade elétrica (ME), com múltiplos estímulos para a adoção dos veículos elétricos (VE), em detrimento dos veículos a combustão interna (VCI), cuja proibição para venda de viaturas novas movidas a combustíveis fósseis ocorrerá em 2035 a nível europeu.

Globalmente, a ME tem testemunhado um crescimento notável. Em 2022, 14% dos novos veículos foram elétricos, um aumento significativo face aos 9% registados em 2021. No entanto, este é ainda um segmento centralizado nos três principais mercados - China, Europa e Estados Unidos – que representam cerca de 95% das vendas globais de VE em 20223.

Entre os mercados-chave, a China emerge como força motriz, com mais de metade dos VE do mundo a circular em estradas chinesas. Esta preeminência numérica evidencia a visão estratégica do país, a qual se materializou mediante a simultânea expansão de subsídios e incentivos não só ao consumidor, mas também aos fabricantes dos segmentos fulcrais da cadeia de valor da ME.
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Embora a China seja o maior mercado de VE em termos absolutos, a Europa está na 2ª posição, dominando outras métricas, especialmente através do contributo dos países nórdicos. O país referência a nível mundial é a Noruega em que os VEs alcançaram um market share de 79%4 em 2022, sendo o Tesla Model Y o veículo mais vendido na história do país, superando o Volkswagen Beetle de 1969 em vendas anuais5.

Na União Europeia, 75% das vendas de VE estão concentradas em quatro países com PIB per capita acima de 45 mil euros (Suécia, Dinamarca, Finlândia e Países Baixos). Os restantes 25% estão distribuídos pelos outros 23 Estados Membros6. O relatório da Associação Europeia de Fabricantes de Automóveis demonstra que, no continente europeu, a adoção de VE está diretamente ligada ao PIB per capita, apontando a acessibilidade económica como problema-chave. E os consumidores parecem concordar: 50% apontam o custo total de propriedade como uma das principais apreensões para adquirir um VE7.

Na Noruega, tal como na China, a mudança não aconteceu “da noite para o dia”. As políticas favoráveis à ME foram gradualmente introduzidas desde a década de 90, mantidas por um longo período, e aceleradas nos últimos anos. Estas vão desde isenções fiscais a outros incentivos de uso. Embora o IVA dos veículos em geral seja 25%, os elétricos são isentos de IVA. Relativamente a benefícios de uso, as estradas e o estacionamento são gratuitos para VE. Em 2017, o Parlamento norueguês anunciou o objetivo mais ambicioso no mundo a nível da ME ao estabelecer como objetivo para 2025 que todos os carros novos vendidos sejam de emissão zero, indo além do objetivo europeu.

As infraestruturas públicas e privadas de carregamento têm-se demonstrado como fator crucial para impulsionar a adoção de VE, sendo a principal preocupação do consumidor8. Para além da falta de infraestruturas, outra inquietação prende-se com a sua autonomia e capacidade de satisfazer as necessidades do utilizador. De acordo com o estudo da EY9, 33% dos compradores de novos automóveis apontam a distância que um VE pode percorrer com a bateria totalmente carregada como a segunda maior preocupação, equiparada com a falta de carregadores (34%).

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Na Noruega, a instalação de carregadores foi também priorizada e alavancada monetariamente desde cedo. A presença de dezenas de empresas dedicadas à instalação e operação de pontos de carregamento é uma demonstração contundente de que a concorrência fomenta a inovação e agilização10.

Na Holanda, evidenciam-se também boas práticas no âmbito da infraestrutura, com 29% dos pontos de carregamento a nível europeu, apesar de ser um país geograficamente pequeno relativamente aos países acima mencionados, ganhando o título de nação com mais carregadores. Este ano já ultrapassou o marco de 500 mil11, alicerçando o objetivo de atingir 1,8 milhões de postos públicos, semipúblicos e privados até 2030. As medidas implementadas incluem, por exemplo, que se os residentes de um município precisarem de um ponto de carregamento, a municipalidade fornece um carregador público gratuitamente. Há também benefícios fiscais para empresas através de um sistema que proporciona deduções adicionais no imposto de renda corporativo e empresarial.

Outros países parecem seguir as mesmas pegadas, reconhecendo a importância de estimular a expansão contínua da rede de carregamento o mais rapidamente possível. Na Bélgica, foram anunciados incentivos temporários adicionais até ao próximo ano. A ênfase recai na premência da implementação, pois quanto mais cedo a instalação for executada, maior é o incentivo12. Empresas que instalem estações de carregamento de acesso público até setembro de 2024 beneficiam de uma dedução do investimento no cálculo do imposto de 150% (até este ano, a dedução era de 200%). Particulares podem usufruir de uma redução no imposto de renda pessoal de 35% se instalarem carregadores até ao fim do ano, ou de 15% caso o façam até setembro de 2024. Contudo, há condições para ter acesso a estes benefícios: o ponto de carregamento deve ser inteligente, alimentado por “energia verde” e deve ser um profissional qualificado a instalá-lo. No Reino Unido, para além de se subsidiarem os pontos de carregamento residenciais para proprietários ou arrendatários, também se aplica uma taxa reduzida de IVA, fixada em 5%, sobre a eletricidade doméstica, em vez da taxa de 20%13.

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Nos Estados Unidos, o mercado que fecha o pódio de vendas, a meta é atingir a participação de mercado para VE de 50% em 2030. Atualmente, a adoção da ME é estimulada através de créditos fiscais inscritos na Lei de Redução da Inflação (IRA). Relativamente a infraestrutura, a Lei de Investimento em Infraestrutura e Empregos (IIJA) alocou 2,5 mil milhões de dólares em subsídios para enfrentar lacunas no sistema nacional de carregamento. Esse investimento estratégico pretende catalisar a participação ativa de empresas privadas na expansão da rede de carregamento, para aprimorar a acessibilidade e a conveniência dos utilizadores de VE. Como tal, a expansão da rede tem-se materializado em âmbitos para além dos tradicionais: plataformas de viagens e propriedades, como a popular Airbnb, já adotaram a instalação de estações de carregamento de VE como parte das comodidades oferecidas. Esta integração torna o processo de carregamento mais acessível para os proprietários de VE e também normaliza a tecnologia.
A estratégia tem-se traduzido em conquistas concretas com a emblemática estrada dos Estados Unidos, Route 50, que possui carregadores rápidos, possibilitando o uso de VE apesar das suas características desafiadoras e contexto geográfico diversificado – agora alinhados com as necessidades da crescente comunidade de ME.

Em Portugal, a distância média diária no percurso casa-trabalho é de 50 km. Examinando o perfil do condutor português traçado pelo Automóvel Club de Portugal, constata-se que este conduz 50 a 200 km por semana e usa o carro diariamente14. Em 2021, a autonomia média para um VE já era de 349 km15, viabilizando a utilização sem receio e desmistificando esta premissa – isto, desde que a infraestrutura de carregamento esteja garantida, seja em lugares de acesso público, na residência ou no trabalho.

O País tem vindo a apostar na ME desde 2010, iniciando-se com a publicação do Decreto-Lei nº 39/201016 que regula a organização, o acesso e o exercício das atividades de ME, bem como os sistemas de incentivo à utilização de VE. Procedeu, ainda, ao estabelecimento de uma rede piloto de carregamento para a ME, levada a cabo pela MOBI.E17 uma empresa pública que atua, desde 2015, como Entidade Gestora da Rede de Mobilidade Elétrica (EGME), assumindo a responsabilidade de gestão e monitorização da rede de postos de carregamento elétricos, designadamente em termos de fluxos energéticos, de informação e financeiros.

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Ao longo dos anos foram várias as atualizações legislativas e regulamentares no âmbito da ME em Portugal, desde o regime jurídico aplicável aos agentes da ME, nomeadamente aos Operadores de Ponto de Carregamento (OPC), aos Detentores de Ponto de Carregamento (DPC), aos Comercializadores de Eletricidade para a Mobilidade Elétrica (CEME), bem como a abordagens de carregamento dos pontos de carregamento a nível público e privado, quer ao nível dos acessos, quer ao nível das tarifas aplicáveis.

São diversos os estímulos para a adoção da ME em Portugal, que complementam as vantagens inerentes ambientais ou tecnológicas destes veículos. Essas vantagens incluem a crescente oferta de modelos de VE com elevado desempenho, equipados com baterias robustas proporcionando maior autonomia e conforto. A par destas, há outros estímulos para a adoção da ME, desde incentivos financeiros para a aquisição de VE, como seja o programa “Incentivo pela Introdução no Consumo de Veículos de Emissões Nulas”18, lançado anualmente pelo Governo e gerido pelo Fundo Ambiental; maiores acessibilidades, nomeadamente no acesso a lugares de estacionamento dedicado, quer para parqueamento, quer para carregamento, contando a rede pública com cerca de 3700 postos para o efeito19; e benefícios fiscais, tais como a isenção do Imposto sobre Veículos (ISV), a isenção do Imposto Único de Circulação (IUC) ou dedução do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) para as empresas, entre outras.

Estes estímulos traduzem-se na crescente adoção da ME em Portugal, com sucessivos recordes anuais, tendo-se registado no primeiro semestre de 2023 a venda de cerca de 36.000 VE pelos Representantes Oficiais das Marcas (ROM), em todas as categorias de veículos, valor similar ao total anual registado em 2022, e que contrasta com os cerca de 20.000 VE vendidos em 2020, sendo expectável a manutenção desta tendência de crescimento.
Contudo, é importante reconhecer que os VE não representam apenas uma escolha com benefícios económicos e mais ecológica, mas também têm o potencial de ser um ativo estratégico na transição energética, nomeadamente pelo potencial de auxiliar na integração de renováveis, mediante o carregamento em períodos de maior produção renovável, ou a disponibilização da bateria ao serviço da rede, em períodos críticos de pico.
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No ano passado, durante o apagão no Novo México nos Estados Unidos, foi notícia um utilizador que conectou um inversor à bateria do seu Chevy Bolt para alimentar os aparelhos elétricos na sua residência durante um dia e meio20, demonstrando que os VEs podem atuar como fonte de reserva. Embora a adoção de painéis solares e baterias residenciais já esteja em curso, o uso de VEs poderia tornar essa configuração mais acessível para um público mais amplo, à medida que os custos dos VEs diminuem.

Para acelerar a transição para uma mobilidade mais sustentável em Portugal, é fundamental adotar uma abordagem abrangente e coordenada, e seguir as boas práticas. Enquanto a Noruega levou 2.5 anos para aumentar sua participação de mercado de VE de 2% para 10%, o Reino Unido alcançou essa participação em 1.5 anos, e a Alemanha em apenas um ano. Embora as políticas fiscais centradas na compra de VEs sejam o ponto de partida, há outras lições a considerar.
Para o efeito, é essencial: continuar a reforçar a infraestrutura de carregamento tornando-a tão acessível quanto possível; e modernizar a legislação da ME, não apenas harmonizando-a com o setor elétrico, mas também criando um ambiente regulatório propício à entrada de novos agentes de mercado e à criação de modelos de negócios inovadores. A educação e sensibilização do consumidor para a ME também são fundamentais, nomeadamente estimular a partilha de veículos, o uso de sistemas de carregamento inteligentes e a integração eficiente de VE na rede elétrica.
O caminho da evolução crescente da ME em Portugal é desafiador, mas repleto de oportunidades ao promover a mudança de paradigma do setor dos transportes, incentivando a descarbonização. Com a crescente eletrificação do consumo, é essencial reforçar a rede e aumentar a capacidade de receção e injeção renovável. Para atrair investimento em capacidade adicional de energia renovável é necessário criar condições favoráveis, agilizando os processos de licenciamento de renováveis ao nível das abordagens centralizadas e descentralizadas.
Simultaneamente, Portugal trilhará o caminho em direção a uma mobilidade mais limpa e a um sistema elétrico mais sustentável.

  

  1. Cleanwatts, acarreiro@cleanwatts.energy
  2. Aurora Energy Research, ines.gaspar@auroraer.com
  3. Agência Internacional de Energia (IEA) - Global EV Outlook 2023 “Catching up with climate ambitions”.
  4. Norsk elbilforening - “Norwegian EV policy”.
  5. Bloomberg – “Norway pulls the plug on EV tax incentives and subsidies”. Julho 2023.
  6. Associação Europeia de Fabricantes de Automóveis (ACEA) - Progress Report 2022 “Making the Transition Zero-Emission Mobility”.
  7. Ernst & Young (EY) – EY Mobility Consumer Index 2022 study.
  8. Ernst & Young (EY) – EV Country Readiness Index 2021
  9. Ernst & Young (EY) – EY Mobility Consumer Index 2022 study.
  10. Vox Podcast “Today Explained” – “It’s Electric!”. 2021.
  11. NL Times – “Netherlands now has more than 500,000 electric car charging points, says new report”. Junho 2023. Link.
  12. LeasePlan “EV Readiness Index 2023”
  13. LeasePlan “EV Readiness Index 2023”
  14. Automóvel Club de Portugal (ACP) – Estudo “Condutor Português”. Observatório do ACP. 2018.
  15. IEA – Evolution of average range of Electric Vehicles by Powertrain 2010-2021.
  16. https://diariodarepublica.pt/dr/detalhe/decreto-lei/39-2010-614137
  17. https://www.mobie.pt/
  18. https://www.fundoambiental.pt/apoios-2023/mitigacao-de-alteracoes-climaticas/incentivo-pela-introducao-no-consumo-de-veiculos-de-emissoes-nulas-ven-2023.aspx
  19. https://www.mobie.pt/mobidata/data
  20. Washington Post – “Electric vehicles can now power your home for three days”. Fevereiro de 2023. Link.

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